Inês

Caderno Braille

Postado há 7 anos

Por Inês

APRENDENDO O BRAILLE: UM EXERCÍCIO DE CIDADANIA Caderno pedagógico

Autora

Marcilene Aparecida Alberton Ghisi Chaves

Colaboradores

Daiani Domingos Gilmar Silva Amaral Inês Berlanda Seidler Solange Cristina da Silva Vitor Chaves

  SUMÁRIO APRESENTAÇÃO CAPITULO I – VIAJANDO NO TEMPO: O BRAILLE EM FOCO SEÇÃO 1 – Louis Braille uma janela para acessibilidade ao conhecimento SEÇÃO 2 – Como funciona o código da simbologia Braille SEÇÃO 3 - As diversas abrangências do Braille CAPÍTULO 2 – O BRAILLE COMO SISTEMA AUXILIAR NO PROCESSO DE INCLUSÃO SEÇÃO 1 - Percebendo a importância do Sistema Braille Atividade

CONSIDERAÇÕES FINAIS PARA SABER MAIS

APRESENTAÇÃO

Você, aluno, certamente já ouviu falar sobre a Simbologia Braille. Então, retome suas lembranças sobre esse assunto, pois estas poderão contribuir neste estudo. Aproveite, então, o conteúdo deste caderno pedagógico para aprofundar seus conhecimentos e esclarecer suas dúvidas. Por meio desta leitura, juntamente com as abordagens já realizadas em sala, você irá construir/rever conhecimentos e quebrar preconceitos em relação à questões sobre a cegueira, o sujeito cego e sua forma de ler e escrever, bem como contribuir para mudanças de atitudes visando a inclusão desse segmento. Neste caderno todos os capítulos se complementam com reflexões específicas, figuras ilustrativas do conteúdo trabalhado, propostas de atividades, busca de informações na internet e indicação de leituras, vídeos, sites, entre outros aspectos importantes à formação do aluno. Aprenda com prazer!

CAPÍTULO I – VIAJANDO NO TEMPO: O BRAILLE EM FOCO

“Os pontos Braille são sementes de luz levadas ao cérebro pelos dedos, para germinação do saber." Helen Keller

Vamos, aqui, realizar uma breve viagem pela história do Sistema Braille, dando, além disso, rápidas pinceladas acerca de como tal formato de escrita e leitura foi tornando-se significativo para as pessoas cegas de todo o mundo.

SEÇÃO 1 – Louis Braille uma janela para acessibilidade ao conhecimento

Há mais de 150 anos que o "Braille" é o meio usado por excelência pelas pessoas cegas para a leitura e escrita. É interessante notar que mesmo com o advento das novas tecnologias e o conseqüente aparecimento de formas de acesso alternativas, o Braille continua a ser o melhor meio de tomar contato com a escrita, mais precisamente, com a ortografia das palavras, pois é ele quem proporciona a “beleza” de poder-se tocá-las.. Para muitas pessoas cegas nada substitui o prazer de ler um livro, de tocar os pontos com os dedos ou sentir a textura do papel. Luís Braille devia ter pouco mais de quinze anos quando inventou o seu código de escrita. O jovem francês, nascido em 1809, próximo de Paris, tinha cegado aos três anos de idade, após um acidente, mas não desistiu de tentar aprender. Uma bolsa de estudo permitiu-lhe ingressar, em 1819, no Instituto para Jovens Cegos, em Paris, onde se ensinava a ler através da impressão de textos em papel muito forte, que permitia dar relevo às letras. O sistema não era perfeito, mas possibilitava a leitura. O pior era o momento de escrever. Era impossível! Braille interessou-se então por um sistema de escrita inventado pelo capitão Charles Barbier de La Serre - que cegara na Palestina - para transmissões noturnas em campanha, também baseado em pontos em relevo, e buscou aprimorá-lo. É importante reconhecer o mérito de Barbier por atribuir aos dedos a arte de decifrar os símbolos em relevo; contudo, seu sistema não permitia o domínio da gramática por ter somente valor fonético, não havendo simbologia para pontuações, nem símbolos para registro da matemática e de notações musicais. Também a complexidade das combinações tornava a leitura deste método muito lenta. O diâmetro e a disposição dos pontos forçava o ziguezaguear dos dedos. A habilidade desenvolvida por Louis através da prática e de estudos aprofundados, pouco a pouco foi readaptando o sistema de Barbier, como, por exemplo, a posição dos pontos, fazendo novas combinações, chegando a propor para Barbier significativas alterações. Barbier embora reconhecesse a importância de tais mudanças, não queria ver o fundamento básico de seu método modificado. Devido à resistência de Barbier, Braille, inspirado naquela geniosa invenção, dedicou-se então a formulação de um novo sistema. Pontos e relevos, através do poder tátil dos dedos, foram a bússola norteadora para obra do inventor francês nascido cego. Um método capaz de fornecer as pessoas cegas uma maior agilidade na leitura, e que pudesse suplantar os problemas da escrita sonográfica. Durante muitos dias Braille trabalhou incansavelmente no seu experimento, e nas férias em seu lar continuou a aperfeiçoá-lo. Finalmente na reabertura das aulas em outubro de 1824, teve enfim a concretização de seu invento. Aos quinze anos de idade havia criado o que hoje conhecemos como simbologia Braille. Uma disposição de seis pontos formando duas colunas de três linhas. Estes pontos podendo ser combinados de sessenta e três maneiras diferentes, tornando assim possível representar as letras do alfabeto, sinais matemáticos, acentuações e pontuações. Tudo isso apenas com as pontas dos dedos, de tal modo que cada toque correspondia a uma imagem ou código, dinamizando assim os processos de subjetivação interior da pessoa cega. Em 1829, publicou o primeiro manual onde o novo código que haveria de ficar para sempre com o seu nome aparecia sistematizado, mas existem alguns documentos que provam que o jovem Louis já utilizava este alfabeto há pelo menos cinco anos. Nesta sua primeira versão do alfabeto Braille, o sistema estava praticamente definido. No Brasil este processo de absorção do Braille, pode ser historicizado sob três períodos distintos: -1854-1942. Graças à contribuição de um jovem cego, José Álvares de Azevedo que havia estudado na França, em 1854, o Braille foi adotado pelo Instituto Imperial dos Meninos Cegos, sendo este hoje o Instituto Benjamin Constant, localizado na cidade do Rio de Janeiro. Na América Latina, foi a primeira escola de cegos a utilizar o Braille. Em relação a alguns países, o Braille no Brasil teve uma ótima aceitação, sendo reproduzida praticamente toda a simbologia original utilizada na França. Aqui, o método desenvolveu-se com toda a facilidade porque não encontrou, diferentemente de outros países, outros métodos ou sistemas rivais ou tradicionais, tal qual o de Valentin. Ou seja, aqui não havia nenhuma outra maneira das pessoas cegas poderem escrever e ler, até então. -1942-1963. Neste período, para atender as reformas ortográficas da língua Portuguesa de 1942, o antigo alfabeto Braille de origem francesa foi adequado às novas necessidades de nossa língua. Também foi empregada a tabela Tailor de sinais matemáticos em substituição a simbologia francesa até então utilizada. Em 13 de novembro de 1945, através da portaria nº. 552 foi estabelecido no Brasil o uso oficial do Braille. -1963-1995. Já nesta época, pode-se destacar como fatos marcantes o convênio luso-brasileiro realizado entre as instituições mais importantes dos dois países para a padronização da simbologia Braille integral. Outro aspecto foi a adoção da simbologia no Brasil de abreviatura utilizada em Portugal. No tocante a matemática, ouve a implementação da tabela Tailor com acréscimo de símbolos Braille aplicáveis na teoria de conjuntos. Também foi homologada em 1995 pela União Brasileira de Cegos, a Comissão Brasileira do Braille que deveria ser composta por cinco membros. Estes deverão ser preferencialmente usuários fiéis do Braille, além de possuírem experiência na produção do material Braille e na educação das pessoas cegas. Sendo assim, esta comissão brasileira de Braille, através de estudos criteriosos realizados junto a comissão de Portugal, e amparados pelo acordo de colaboração BrasilPortugal, protocolado em Lisboa em 25 de maio de 2000, elaboraram o Código de Grafia Braille para a Língua portuguesa. Este documento normatizador, de consulta, destinado aos transcritores e usuários do Braille e aos professores ligados a educação das pessoas cegas teve sua aprovação em 24 de setembro de 2002, através da portaria nº 2678. A intencionalidade deste ato diz respeito a políticas para diretrizes e normas de uso, ensino e produção do Braille a nível nacional em suas diversas modalidades de aplicação, especialmente na língua portuguesa. Por exemplo, o livro em tinta a ser transcrito pelo profissional para a grafia Braille, terá sempre por base obrigatória essas normas. Luís Braille morreu de tuberculose em 1852, mas deixou um legado imprescindível para a população cega mundial. A sua vida e a sua obra podem ainda hoje ser deslindadas no museu francês com o seu nome, onde, entre outros documentos, se encontram alguns dos primeiros textos escritos no novo alfabeto, na sua adolescência.

SEÇÃO 2. Como funciona o código da simbologia Braille.

O Sistema Braille, como vimos, é o método universal e natural de leitura e escrita para as pessoas cegas. A célula Braille básica é composta por 6 pontos agrupados em duas colunas verticais de três pontos cada. Os pontos da 1ª coluna são os pontos 1, 2 e 3 e os da 2ª coluna são os pontos 4, 5 e 6. O valor dos pontos se dá da seguinte forma:

  • Para escrever 1, 2, 3 na direita 4, 5, 6 na esquerda. Para ler

  • 1, 2, 3 na esquerda

  • 4, 5, 6 na direita. Descrição de figura: Figura da Cela Braille. Fim da descrição.

Com esta célula básica cujo tamanho é perfeitamente abrangível pela área da polpa de um dedo, e reconhecível pelos milhares de receptores ali localizados, podem-se construir 63 diferentes combinações. Com estas combinações, facilmente identificáveis pelo tato, podem-se representar letras, números, sinais de pontuação, sinais matemáticos etc. Uma página Braille típica contém 26 a 28 linhas e 30 a 32 caracteres por linha. Uma página escrita em tinta resulta aproximadamente em três páginas escrita em Braille. Sinal referencial ou fundamental – assim chamado porque é o que dá origem a todas as demais combinações, ou seja, é a cela cheia, com os seis pontos. Os sinais do sistema Braille recebem designações diferentes, dependendo do espaço que ocupam. Aqueles em cuja constituição figuram os pontos 1 e/ou 4, mas em que não entram os pontos3 nem 6, chama-se sinais superiores. Aqueles que são formados sem os pontos 1 e 4 chamam-se sinais inferiores. Os que ocupam só uma cela denominam-se sinais simples. Exemplo: (1,2,4,5)

Chamam-se sinais compostos os que obtêm combinando dois ou mais sinais simples. Exemplo: (3,3,3) Os 63 sinais simples do sistema Braille, distribuem-se sistematicamente por 7 séries: 1a série: série superior, utiliza os pontos superiores 1,2,4,5.

2a série: é resultante da adição do ponto 3 a cada um dos sinais da 1a série.

3a série: é resultante da adição dos pontos 3 e 6 aos sinais da primeira série.

4a série: é resultante da adição do ponto 6 aos sinais da 1a série.

5a série: é formada pelos sinais da 1a série posicionados na parte inferior da cela.

6a série: é formada com a combinação dos pontos 3,4,5,6.

7a série: é formada por sinais que utilizam os pontos da coluna direita da cela (4,5,6).

Um dos instrumentos mais utilizados para a escrita em Braille, devido ao seu custo mais acessível, é a reglete. A reglete pode ser de vários tamanhos, feita de plástico, alumínio ou metal. É constituída de linhas, que podem variar em número, de acordo com o equipamento. Nestas situam-se as celas Braille, dentro das quais vai-se escrevendo com o punção (instrumento de perfuração) ponto a ponto. Este modo de escrever torna o trabalho bastante lento, exigindo do aluno que o utiliza maior esforço para acompanhar o professor e fazer suas anotações.

Descrição de figura: Foto de uma reglete com punção. Fim da descrição. Na descrição anterior, você pôde perceber que, a posição dos pontos modifica-se para escrita e leitura. Isso ocorre pelo fato de que na utilização da reglete a escrita acontece da direita para a esquerda, e a leitura aparece no verso da folha e deve ser feita de maneira convencional da esquerda para a direita. Embora na reglete se altere a posição dos pontos, a grafia permanece a mesma respeitando suas combinações. Na utilização da “máquina de datilografia Braille” a escrita ocorre normalmente como se dá a leitura, pois os pontos são impressos já no verso da folha. Ela possui nove teclas, sendo seis para a escrita, que se dá letra a letra, uma para a troca de linhas, outra para retroceder um caractere e outra que é específica para a barra de espaço.

Descrição de figura: Máquina de datilografia Braille. Fim da descrição.

A escrita dos símbolos se constitui através das combinações conforme a figura, a seguir, nos mostra.

Produção de texto em Braille. Vamos, agora, discutir um pouco sobre a produção de textos em Braille. É bastante complexa a tarefa de transcrever para o Braille um livro didático ou texto para ser trabalhado em sala. A transcrição Braille consiste na conversão do que está escrito em tinta para este formato. A Comissão Brasileira do Braille estabelece normas para adaptação de texto em tinta. Esta adaptação requer uma análise pedagógica minuciosa com o objetivo de adequar o material a leitura tátil. O adaptador deve seguir as normas e manter a máxima fidelidade ao texto em tinta, pois o aluno cego tem o direito de receber todas as informações do material tal qual o aluno vidente. Além disso, no caso de textos ou livros utilizados em sala de aula poderá haver a leitura e comentários do mesmo. Se as ilustrações, tais como figuras, desenhos, gráficos etc., forem significativas ao texto, complementam os dados, devem ser descritas em texto ou transformadas em relevo. Mesmo o adaptador tendo clareza das normas, é importante que todo material passe por uma revisão, preferencialmente por um profissional cego. A transcrição Braille pode ser realizada de duas formas: por meio do computador ou por meio da máquina de datilografia Braille. No caso da transcrição informatizada, esta é realizada por meio do uso de um software de conversão, podendo-se citar entre outros o Braille Fácil. Após a conversão no computador é feita a impressão utilizando-se da impressora Braille. A máquina de datilografia Braille , permite a transcrição manual. Entretanto, é inadequada para a produção de grande volume, em função do excessivo trabalho e o tempo utilizado.

SEÇÃO 3. As diversas abrangências do Braille e sua importância.

Atualmente o Braille não é a única fonte de escrita e leitura disponível para a pessoa cega, haja vista que os avanços tecnológicos proporcionam a utilização do computador com sintetizador de voz que permite de uma forma rápida e eficiente o contato deste com obras que não se encontram transcritas neste sistema. Salienta-se que, tanto o formato digital quanto o áudio, apesar de proporcionarem maior agilidade na produção e acesso aos materiais, não substituem o Braille, pois este é o meio que oportuniza aprendizagem mais eficiente em determinadas áreas do conhecimento, principalmente, conforme aqui já se disse, no que diz respeito à questão ortográfica, bem como as ciências exatas. A utilização dos outros recursos de escrita e leitura deve ser feita de maneira auxiliar no acesso ao conhecimento a partir do momento que o indivíduo domine a estruturação das palavras, ortografia, regras gramaticais, pontuações e construção textual. Em nossos dias podemos encontrar com maior facilidade o Braille impresso em alguns medicamentos, produtos alimentícios e produtos de beleza. Embora ocorra em pequena escala, se constitui em oportunidades de divulgação do sistema Braille proporcionando a acessibilidade ao usuário cego. Outro ponto que merece destaque é a criação da LEI Nº. 12.644 que prevê a confecção de cardápio em Braille nos restaurantes de Santa Catarina.

“Art. 1º Ficam os hotéis, restaurantes, bares e similares, estabelecidos em Santa Catarina, que possuam cardápios como meios informativos de seus produtos aos clientes, obrigados a produzir e dispor de exemplar na linguagem em braile, para o atendimento às necessidades dos deficientes visuais. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei considera-se cardápio como sendo encarte que contenha o rol de produtos oferecidos normalmente aos clientes desses estabelecimentos.” (Ministério Público de Santa Catarina, 2007) Precisamos esclarecer que o teor da Lei não está correto quando coloca o Braille como uma linguagem; o Braille consiste, como já foi possível perceber, num sistema de leitura e escrita que, para tal, tem, em nosso caso, a língua portuguesa como base. Portanto, sempre que se quer passar textos do Braille para a tinta e vice-versa, diz-se transcrever e não traduzir. Como esta, outras leis como a Lei nº 10.753 (Ministério da Fazenda, 2007), que no seu artigo Art. 1º. institui a Política Nacional do Livro, mediante entre outras diretrizes, a de assegurar às pessoas com deficiência visual o acesso à leitura; a LEI Nº 9.610 (Brasil, 2007) que no seu Art. 46 informa que não constitui ofensa aos direitos autorais a reprodução de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses usuários. Várias medidas voltadas à acessibilidade da pessoa cega são adotadas, como por exemplo em Florianópolis encontramos alguns elevadores com painel adaptado permitindo autonomia na utilização do mesmo. Entretanto, essas ações ainda não são comuns, muito se tendo ainda por fazer. Como é possível perceber, atualmente há uma preocupação em aproximar o Braille enquanto sistema de leitura e escrita da população de maneira geral, buscando torná-lo algo rotineiro, fazendo parte do dia-a-dia como a escrita gráfica. Isto faz com que as pessoas deixem de encarar tal método com estranheza, fato que até pouco tempo atrás era comum, causando mesmo grande espetáculo a visão de uma pessoa cega lendo um livro em Braille. Tal aproximação está diretamente ligada ao exercício da cidadania ao acesso informacional, tão buscado pelos movimentos associativos das pessoas cegas.

  • PARA REFLETIR...

Você conhece alguma pessoa, em sua cidade, que seja cega? Tente lembrar como, historicamente, em seu meio social, foram vistas e tratadas essas pessoas? E uma criança que nasce cega, hoje, nessa mesma cidade, como é recebida? Alguma coisa mudou?

CAPÍTULO 2 – O BRAILLE COMO SISTEMA AUXILIAR NO PROCESSO DE INCLUSÃO

“Ler dá ao homem completude ... e escrever o torna preciso.” (BACON apud KATO, 1986, p.6).

No cenário nacional, a inclusão ainda se caracteriza como um desafio. Essa proposta que tem respaldo legal, demanda uma reorganização social e estrutural, bem como mudanças de atitude. Falar de inclusão é falar de exercício de cidadania. Nesse sentido que aprender o Braille é um exercício de cidadania. A exclusão pode ocorrer também sob um discurso que prega a igualdade, quando oferece acesso igual àqueles que são diferentes. Agora, queremos convidar você a refletir conosco acerca da importância de se aprender o Sistema Braille e a contribuição deste no processo de inclusão da pessoa cega.

SEÇÃO 1 - Percebendo a Importância do Sistema Braille

Neste espaço procuraremos demonstrar porque este formato de leitura e escrita é imprescindível, apesar de todo o desenvolvimento tecnológico que nos proporciona acesso aos computadores com leitores de tela, os quais colocam-nos em contato com o mundo da informação, nos seus vários meandros. Aqui, explicitaremos a necessidade deste Sistema em diversas situações, ressaltando o Braille enquanto um veículo de exercício da cidadania, bem como enquanto possibilitador do acesso à cultura letrada. Estudiosos da problemática da cegueira em todo o mundo civilizado vêm alertando para o fenômeno da desbraillização. A "desbraillização" é o que poderíamos chamar de sub-utilização, ou mesmo em alguns casos, de substituição do sistema Braille por outras ferramentas, tais como, o livro gravado, o texto digital, o artifício da substituição do Braille pela prova ou outros exercícios orais, etc. Indícios desse processo desbraillizador podem ser nitidamente percebidos aqui no Brasil: crianças, adolescentes e jovens cegos estão lendo e escrevendo mal em Braille; se fizermos um levantamento investigativo de como se processa o desempenho das pessoas cegas nos concursos vestibulares, veremos que tem caído significativamente nos últimos anos, o número de aprovações nesses concursos. Por isso entendemos que este sistema deve ser a espinha dorsal do processo ensino-aprendizagem da leitura e da escrita, sendo, pois, insubstituível. Você poderia pensar: Mas a criança que enxerga, desde pequena, começa o seu contato com a escrita, ou seja, começa a compreender o uso social desta forma de comunicação. Logo que nasce, ela depara-se com suas fraldas, mamadeiras, chupetas, enfim, uma imensidade de objetos que contém letras, as quais, inicialmente, não têm qualquer significado para elas, mas isto, aos poucos, vai-se modificando com o desenvolvimento e aquele emaranhado de letras sem sentido vai tomando corpo e ela vai percebendo que nosso mundo atual não sobreviveria sem estes traços tão significativos. . E como mostrar à criança cega que a sua forma de escrita também tem seu uso social, se ela não aparece explícita nas placas, nos livros de história, enfim, não faz parte do seu cotidiano? É indispensável que o Braille comece a aparecer na vida de um bebê cego desde que nasce, colocando o nome dele escrito neste formato em todos os seus objetos de uso pessoal, que ele, apesar de não entender o significado, comece a tocar nos pontinhos e, com o seu crescimento, vai percebendo que aquele “amontoado” de pontos em alto relevo podem representar o seu nome, o nome dos seus pais, enfim, que é a sua forma de escrita e que é assim que ele vai poder tocar nas palavras. Salientamos, ainda, que o sistema Braille coloca o aluno em contato com os sinais matemáticos, com a musicografia, com as regras de cartografia, etc. Essa é, aliás, uma conquista bio-antropológica e cultural. Não podemos privar o aluno cego desse contato que se estabelece entre mão e cérebro, pois ele estaria perdendo um dos maiores legados da humanidade, ou seja, a decifração, o contato com a sua fortuna cultural escrita. Aqui, poderíamos questionar: Mas, e a pessoa que perdeu a visão após a idade adulta, como vai lidar com um sistema que requer um aprimoramento do sentido do tato, que demanda uma memorização de grande quantidade de pontos? É, portanto, preciso que esta pessoa sinta a necessidade do Braille. Ela precisa ter o desejo de apreender esta nova forma de mediação entre ela e o mundo da palavra escrita. Atualmente, temos vivenciado uma busca pela acessibilidade em todos os aspectos: informacional, comunicacional, atitudinal, entre outras, e isto se dá por meio de, como já vimos, uma grande quantidade de legislação que exige, dentre outras coisas, o cardápio em Braille em bares e restaurantes e o número dos andares em Braille nos botões dos elevadores. Isto, sem sombra de dúvida, está intimamente ligado com a cidadania que mencionamos no início deste tópico. Partindo do princípio de que determinados grupos através de seus esquemas de idéias, de suas características específicas, se organizam dentro de um determinado espaço e tempo, entende-se que neste processo de reconhecimento do Braille, primeiro como um instrumento único possibilitador de leitura e registros para as pessoas cegas, sua prática permite ver as representações de uma comunidade que antes estava excluída do campo da escrita e da leitura. Noutras palavras, as práticas e representações, as fronteiras que se foram estabelecendo entre o universo vidente e não-vidente, puderam ser observadas quando o método de Braille oportunizou ao sujeito cegos serem produtores e redatores do seu próprio discurso.

ATIVIDADE

  1. Transcreva para o Braille o texto a seguir e entregue ao professor.

SOMENTE CRIANÇA (Poesia de Inês Berlanda Seidler)

Ao nascer sei que mudei, A dinâmica familiar; Tudo gira em função de minha presença, Todos vem me visitar. Mas o quadro modifica, E isso tenho consciência; Pois tudo mais difícil fica, Quando percebem minha deficiência.

No fundo não me intimido, Até entendo que isso é normal; Pois sei que sou diferente, Deste tal padrão social. Mas não chore não se aflija, Não caia em desesperança, Sinta que estou aqui, E sou a mesma criança.

Tenho medos, tenho dúvidas, E só precisa me ajudar, Assim como outras crianças precisam de ajuda, Pra confiança ganhar. Sei que me falta a visão, Mas muito posso conseguir, Com sua ajuda e utilizando o que tenho, Conceitos irei construir. Não me prive de experiências, Com receio do perigo, Mas pare, tire seu tempo, Sente brincar comigo.

Sua informação me é importante, Pra que eu possa me situar, Neste espaço que pra vocês é natural, O qual eu preciso conquistar.

É preciso que vocês entendam, Que no mundo ninguém é igual, Mas que buscamos o direito, À inserção social.

Na escola eu te peço, Não enumere atividades que eu não posso fazer, Mas busque alternativas pra que eu possa aprender.

Mas, se frente à situações, Te encontrares desorientada, Pare, respire e me veja, Como criança e mais nada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste caderno, você estudou um pouco da história sobre o Braille, conheceu os equipamentos que possibilitam sua escrita, verificou a importância deste sistema para o exercício da cidadania da pessoa cega e teve noções básicas de leitura e escrita neste formato. Como vimos anteriormente, há algumas leis que contemplam a igualdade de oportunidades a todos. A maioria dessas leis determinam que todos devem ter os mesmos direitos de acesso à educação, à informação, aos espaços públicos, entre outros, bem como devem ser respeitados nas suas diferenças. Pensar no diferente não significa atribuir ao sujeito mais ou menos capacidades e possibilidades, mas sim deixar de lado parâmetros estabelecidos e trabalhar a partir do que seja “diferente” no sentido de atender as necessidades específicas do sujeito; proporcionando deste modo, atendimento especializado para aqueles que dele necessitem. Isso tudo se refere a inclusão. Entretanto, isso exige mudanças sociais, estruturais e pessoais para que esta ocorra de fato. Pensar a inclusão é por conseguinte pensar a conquista e o exercício da cidadania.

REFERÊNCIAS

Belarmino Joana. Universo tátil. Disponibilizado em: http://intervox.nce.ufrj.br/~joana/textos/tecni10.html. Acesso em 24 de março de 2007. Brasil, Presidência da República LEI Nº 9.610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998. http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L9610.htm. Acesso em 23 de março de 2007. KATO, M. A. No mundo da escrita: Uma perspectiva psicolingüística. São Paulo: Ática, 1986. Ministério da Fazenda. Lei nº 10.753, de 30 de outubro de 2003. http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/Leis/2003/lei10753.htm. Acesso em 23 de março de 2007. Ministério Público do Estado de Santa Catarina. LEI Nº 12.644, de 21 de julho de 2003. http://www.mp.sc.gov.br/legisla/est_leidec/lei_estadual/2003/le12644.htm. Acesso em 23 de março de 2007. Seidler, Inês Berlanda. Somente Criança. 2006. (Texto mimeografado) Venturini, Jurema Lucy. Terezinha Fleuryde Oliveira Rossi. Louis Braille: sua vida e seu sistema. In Amaral, Gilmar Silva. Trabalho de conclusão de curso da graduação de História da UDESC, Florianópolis, 2007. (texto mimeografado)   PARA SABER MAIS...

INDICAÇÕES DE LEITURAS

• Para complementar seu estudo sobre a teoria:

  1. GARCIA, Rosalba M. Cardoso. A Educação de Sujeitos Considerados Portadores de Deficiência: contribuições vygotskianas. In Revista Ponto de Vista, n.1, jul./dez. 1999.

  2. PADILHA, Anna Maria L. Possibilidades de histórias ao contrário. SP: Plexus,1997

  3. SÁ, Elizabeth Dias de. A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO BRAILLE: Anais do I Simpósio Brasileiro Sobre o Sistema Braille (p. 328-30) MEC/SEESP, 2001 http://www.bancodeescola.com. Acesso em 04 de abril de 2007.

  4. OLIVA, Filipe Pereira. O BRAILLE NA INFORMAÇÃO. In: Anais do I Simpósio Brasileiro Sobre o Sistema Braille, Salvador-BA, SEESP/MEC - Secretaria de Educação Especial / Ministério da Educação. http://www.bancodeescola.com. Acesso em 04 de abril de 2007.

  5. BORGES, Eunice Vieira. SISTEMA BRAILLE PARA VIDENTES. In: Anais do I Simposio Brasileiro Sobre o Sistema Braille, Salvador-BA, SEESP/MEC - Secretaria de Educação Especial / Ministério da Educação. http://www.bancodeescola.com. Acesso em 04 de abril de 2007.

  6. MACHADO, Edilene Vieira. A IMPORTÂNCIA DO (RE)CONHECIMENTO DO SISTEMA BRAILLE POR PESSOAS VIDENTES. In: Anais do I Simposio Brasileiro Sobre o Sistema Braille, Salvador-BA, SEESP/MEC - Secretaria de Educação Especial / Ministério da Educação. http://www.bancodeescola.com. Acesso em 04 de abril de 2007.

• Para trabalhar com seus alunos em sala ou com seus filhos e amigos – obras de Literatura Infantil que abordam temas como preconceito, diferença etc:

LÊDO, Ivo. O Canário Azul. Editora Scipione, série diálogo, 1997. MELLO, Cléo Buarque. A turma do agito diferente: com outras formas de pensar, ver, ouvir, falar, andar...2a.edição, Niterói/RJ: Lachâtre, 1999. ROSS, Tony. Esta é Silvia. Florianópolis:Editora Moderna, 2001. GIRARDET, Sylvie e ROSADO, Puig. Os camelos e o dromedário. São Paulo: Scipione, 2002. REIS, Lúcia. A zebrinha preocupada. São Paulo:FTD, 2001. OTERO, Regina & RENNÓ, Regina. Ninguém é igual a ninguém. São Paulo: Editora do Brasil, 1998.

INDICAÇÕES DE SITES

• Para complementar seus conhecimentos, acesse:

  1. O site www.lerparaver.com;

  2. A UDESC VIRTUAL e conheça o site com informações diversas no que se refere a trabalhos com pessoas cegas e com baixa visão: www.udesc.virtual.br/dvisual, entre outros.

  3. www.ibc.gov.br;

2605 Visualizações